(Extrato do Livro "O Estado e a Revolução", cap. I , escrito em agosto-setembro de 1917)
V. I. Lênin
O Estado, produto do caráter inconciliável das contradições de classes
(...) O Estado é o produto e a manifestação do antagonismo inconciliável das classes. O Estado aparece onde e na medida em que os antagonismos de classes não podem objetivamente ser conciliados. E, reciprocamente, a existência do Estado prova que as contradições de classes são inconciliáveis.
É precisamente sobre esse ponto de importância capital e fundamental que começa a deformação do marxismo, seguindo duas linhas principais.
De um lado, os ideólogos burgueses e, sobretudo, os da pequena burguesia, obrigados, sob a pressão de fatos históricos incontestáveis, a reconhecer que o estado não existe senão onde existem as contradições e a luta de classes, “corrigem” Marx de maneira a fazê-lo dizer que o Estado é o órgão da conciliação das classes. Para Marx, o Estado não poderia surgir nem subsistir se a conciliação das classes fosse possível. Para os professores e publicistas burgueses e para os filisteus despidos de escrúpulos, resulta, ao contrário, de citações complacentes de Marx, semeadas em profusão, que o Estado é um instrumento de conciliação das classes. Para Marx, o Estado é um órgão de dominação de classe, um órgão de submissão de uma classe por outra; é a criação de uma “ordem” que legalize e consolide essa submissão, amortecendo a colisão das classes. Para os políticos da pequena burguesia, ao contrário, a ordem é precisamente a conciliação das classes e não a submissão de uma classe por outra; atenuar a colisão significa conciliar, e não arrancar às classes oprimidas os meios e processos de luta contra os opressores a cuja derrocada elas aspiram. (...)
Em Kautsky, a deformação do marxismo é muito mais sutil. “Teoricamente”, não nega que o Estado seja o órgão de dominação de uma classe, nem que as contradições de classe sejam inconciliáveis; mas, omite ou obscurece o seguinte: se o Estado é o produto da inconciliabilidade das contradições de classe, se é uma força superior à sociedade, “afastando-se cada vez mais da sociedade“, é claro que a libertação da classe oprimida só é possível por meio de uma revolução violenta e da supressão do aparelho governamental criado pela classe dominante e que, pela sua própria existência, “se afasta” da sociedade.
Destacamentos especiais de homens armados, prisões, etc.
“O segundo traço característico do Estado é a instituição de um poder público que já não corresponde diretamente à população e se organiza também como força armada. Esse poder público separado é indispensável, porque a organização espontânea da população em armas se tornou impossível desde que a sociedade se dividiu em classes... Esse poder público existe em todos os Estados. Compreende não só homens armados, como também elementos materiais, prisões e instituições coercivas de toda espécie (...)”.
Engels desenvolve a noção dessa “força” que se chama Estado, força proveniente da sociedade, mas superior a ela e que dela se afasta cada vez mais. Em que consiste, principalmente, essa força? Em destacamentos de homens armados que dispõem das prisões, etc. (...).
O Estado, instrumento de exploração da classe oprimida
Para manter um poder público separado da sociedade e colocado acima dela, são necessários os impostos e uma dívida pública.
“Investidos do poder público e do direito de cobrança dos impostos - escreve Engels - os funcionários, considerados como órgãos da sociedade, são colocados acima da sociedade. (...) Fazem-se leis especiais sobre a ‘santidade’ e ‘imunidade’ dos funcionários.” (...)
“(...) Como o Estado nasceu da necessidade de conter os antagonismos de classe, e como ele, porém, ao mesmo tempo, nasceu no meio do conflito destas classes, ele é, em regra, o Estado da classe mais poderosa, economicamente dominante, a qual por meio dele se torna também a classe politicamente dominante e assim adquire novos meios para a repressão e exploração da classe oprimida. Não só o Estado antigo e o Estado feudal eram órgãos de exploração dos escravos e dos servos, como também o Estado representativo moderno é um instrumento de exploração do trabalho assalariado pelo capital. (...)”.
“Na República democrática” - continua Engels - “a riqueza exerce o seu poder indiretamente, mas com maior segurança”, a saber, em primeiro lugar, pela “corrupção pura e simples dos funcionários” (América), em segundo lugar por meio da “aliança entre o Governo e a Bolsa” (França e América).”
Atualmente, o imperialismo e a dominação dos bancos têm “desenvolvido”, com uma arte requintada, em todas as repúblicas democráticas, esses dois meios de manter e exercer a onipotência da riqueza. (...)
É preciso notar ainda, que Engels definiu o sufrágio universal de uma forma categórica: um instrumento de dominação da burguesia. (...)
Os democratas pequeno-burgueses, do gênero dos nossos socialistas-revolucionários e mencheviques, e os seus irmãos gêmeos, os social-patriotas e oportunistas da Europa ocidental, esperam, precisamente, “mais” do sufrágio universal. Compartilham e incutem no povo a falsa idéia de que o sufrágio universal, “no Estado atual”, é capaz de revelar verdadeiramente a vontade da maioria dos trabalhadores e assegurar que seja posta em prática.
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