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CRISES DO CAPITAL POR VALÉRIO ARCARY

Disponível em http://www.arcary.cjb.net/

Por quê não poderá existir um capitalismo sem crises cada vez mais severas?

Cinco polêmicas sobre os prognósticos d’O Capital e o balanço da história

Valério Arcary,

Professor do CEFET/SP e Doutor em História pela USP

(CLIQUE AQUI para download do texto completo em word - compactação zip)

[...]

Crises de subprodução e de superprodução

Foi n’O Capital que Marx desenvolveu a sua teoria da crise. A crise econômica foi compreendida pelo marxismo, sumariamente, como uma interrupção do processo de reprodução. Ou seja, aquele momento, em que o volume de mão-de-obra produtiva, e o volume de meios de produção e instrumentos de trabalho efetivamente utilizados, é subitamente reduzido. O resultado da crise é uma contração do consumo humano e uma diminuição do consumo produtivo. Em resumo, as crises são perturbações destrutivas. Sob o capitalismo, é preciso que o desemprego em massa pressione o salário médio para baixo, para que os lucros se recuperem.

As crises, no entanto, não são uma tragédia específica da época do capital. Sempre existiram crises econômicas. Mas, antes da revolução industrial, em todas as sociedades e em todas as épocas, as crises econômicas eram provocadas ou por calamidades da natureza, ou por conflitos políticos. Eram acidentes externos às rotinas da vida econômica. Os fluxos sazonais da agricultura, as flutuações da pecuária ou mesmo as oscilações do comércio ou do artesanato eram prejudicados por desastres, como as secas ou as guerras. Nas sociedades pré-capitalistas, em que a exploração econômica assumia uma forma tributária de apropriação do trabalho, ou dos produtos do trabalho pela coerção político-militar, as crises eram precipitadas pela destruição dos fatores de produção, causada ou por catástrofes naturais ou sociais, mas sempre por razões extra-econômicas.

Epidemias, inundações, incêndios, terremotos, ou guerras, migrações e invasões provocavam a destruição de forças produtivas e, em conseqüência, fome e até despovoamento. Estes fatores se entrelaçavam e se determinavam mutuamente, de tal forma, que as crises demográficas eram as conseqüências dramáticas das crises. Por isso, as crises pré-capitalistas foram definidas como crises da subprodução de valores de uso, e se explicam por um grau insuficiente de desenvolvimento da produção. Ou seja, historicamente, tiveram na sua raiz um agravamento da escassez, ou uma ampliação da penúria.

Já o capital introduziu na história um novo tipo de crise, as crises industriais, em que o desemprego resulta de uma abundância de mercadorias que não encontram consumidores. A teoria da crise capitalista em Marx sublinha a idéia, aparentemente paradoxal, de que seria a sobreacumulação de capitais que não encontram valorização ou, dito de outra forma, a superprodução de mercadorias que não encontram compradores, que empurraria, regularmente, a sociedade no abismo de crises de ajuste para garantir a recuperação da taxa média de lucro. Em outras palavras, no capitalismo, a destruição material das forças produtivas não se apresenta como causa, mas como conseqüência da crise.

A crise não seria provocada porque existiria menos trabalho vivo disponível. Ao contrário, haveria mais desemprego porque há crise. Não seria a diminuição da produtividade do trabalho que provocaria o flagelo da fome, mas a deflação gerada pela crise que provocaria o desemprego e multiplicaria as hordas de excluídos. Segundo Marx, a crise capitalista se manifestaria como crise de superprodução, isto é, como um excesso de valores de troca disponíveis.

A dupla natureza da crise cíclica

Esta formulação da crise econômica estabeleceu os fundamentos objetivos da elaboração sobre a teoria da revolução em Marx, já que não seria razoável pensar sequer uma crise política séria, sem o lastro de uma crise econômica que impulsione a experiência material das classes exploradas para a luta na defesa de seus interesses. Vale a pena, entretanto, destacar antes de avançarmos no nosso tema, duas observações provisórias:

  1. A teoria do ciclo de renovação do capital fixo está na raiz da compreensão marxista de que o capitalismo não realiza sua reprodução ampliada sem mergulhar a sociedade em seu conjunto, e o proletariado em particular, em sucessivas, recorrentes, e inexoráveis calamidades, que exigem a destruição parcial de forças produtivas e têm um custo social imensurável. Este processo de passagem da fase ascendente do ciclo à descendente, e vice-versa, pareceria, segundo Marx, obedecer a causalidades endógenas, ou seja, internas ao movimento do sistema. O mecanismo de impulso do ciclo é o processo de acumulação de Capital que estabelece a pulsação de fases de crescimento e de recessão. Os ciclos observados por Marx, e reconhecidos por inúmeros outros estudiosos e escolas econômicas, pareceriam ter uma regularidade decenal, mas, nas últimas três décadas, existiriam evidências de intervalos menores que sugerem um encurtamento do movimento de rotação do capital, uma das contra-tendências que favorecem a recuperação da taxa média de lucro, e adiam uma crise mais devastadora.
  2. A hipótese sugerida por Marx explica que a crise tem uma dupla natureza: (1) é, ao mesmo tempo, um momento de irrupção de irracionalidade histórica, porque cobra de toda a sociedade um sofrimento sistemático e, desta forma, é também o momento de máxima vulnerabilidade do Capital; (2) é a forma como o capitalismo supera as suas contradições, uma vez que é na crise que ocorre a elevação da extração da massa de mais-valia, e a desvalorização de capitais que são exigidos pela necessidade de recuperar os níveis da taxa média de lucro, que incentivarão novos investimentos, a renovação da base tecnológica que ficou obsoleta, permitindo uma nova fase ascendente de crescimento produtivo.

A queda da taxa média de lucro como tendência histórica

Marx apresentou a lei da baixa da taxa média de lucro como sendo uma tendência histórica, tanto por razões metodológicas, como a compreensão dos limites do que podemos considerar como leis históricas, quanto por preocupação política com possíveis simplificações de suas próprias conclusões, como a tentação voluntarista de projetar no tempo uma data limite para a crise final do capitalismo. Para os marxistas, todos os fenômenos da realidade têm uma natureza contraditória, mas isso não significa que seu movimento seja indeterminado. Uma dinâmica se afirma sobre os antagonismos, abrindo passagem sobre os obstáculos. Não há equilíbrio no mundo, mas conflito.

Ainda nos Grundrisse se deteve no comentário das contra-tendências que poderiam neutralizar e até, em determinadas circunstâncias histórico-sociais, inverter de maneira transitória a ação dos fatores que pressionam no sentido da queda da taxa média de lucro e, portanto, da precipitação da crise, como se pode perceber a partir deste fragmento:

"En el movimiento desarrollado del capital existen factores que detiene este movimiento, mediante otros recursos que las crisis; tal como, por ejemplo, la continua desvalorización de una parte del capital existente; la transformación de una gran parte del capital en capital fixe, el cual no presta servicios como agente de la producción directa; improductivo despilfarro de una gran parte del capital, etc [...]Que por lo demás, se pueda contener la baja en la tasa de benefício suprimineto detracciones al mismo, por ejemplo, rebajando los impuestos, disminuyendo la renta del suelo, etc, no es tema que debamos considerar aquí, por mucha que sea su importancia práctica, ya que se trata de de partes del benefício bajo outro nombre y de las que se han apropiado personas que no son el capitalista mismo (...) La disminución se contrarresta, asimismo, mediante la creación de nuevas ramas de producción, en las que se requiere más trabajo inmediato en proporción al capital, o en aquellas donde aún no está desarrollada la fuerza productiva del trabajo, id est, la fuerza productiva del capital (También los monopolios).(grifo nosso)

A sua crítica da economia política estava orientada por um critério histórico chave: a necessidade de demonstrar o caráter transitório e a caducidade do capitalismo e a possibilidade de uma reorganização da produção social da riqueza através da socialização. Mas estava alerta para os perigos de uma análise catastrofista das crises cíclicas, que poderiam alimentar uma perspectiva fatalista de uma morte "natural" do capitalismo, convulsionado por um cataclismo econômico. Destacava, portanto, a operação da queda taxa média de lucro como uma tendência histórica. Ainda assim como uma lei condicionada: a operação de forças de pressão que poderiam ser, pelo menos parcialmente, neutralizadas, adiando um desenlace catastrófico. Mas, ao mesmo tempo, uma tendência irrefreável do movimento de rotação do Capital.

A polêmica sobre a existência em Marx desta formulação da crise foi, evidentemente, muito controversa. Não é esta a interpretação de inúmeros estudiosos d’O Capital, como se pode comprovar neste fragmento de Jorge Grespan:

"A alternância de fases em que a tendência à crise se realiza efetivamente com aquelas em que ela permanece apenas em latência, embutida na acumulação como seu negativo, introduz um elemento essencial no processo, conferindo-lhe o sentido mais rico de padrão ou ritmo em que o termo se manifesta intermitentemente como o ponto de inflexão de uma fase para outra, e não exatamente como um colapso que destruiria completamente, e de uma só vez o sistema" (grifo nosso).

Esta conclusão teórica foi, sem dúvida, uma das hipóteses centrais que influenciou e dividiu a geração marxista da Segunda Internacional em alas irreconciliáveis, já que o tema teórico é indivisível da discussão da articulação da crise econômica e da crise política, e da possível agudização desta em crise revolucionária. Uma outra visão, um pouco distinta da de Grespan, é a apresentada por Lucio Colletti, como se pode conferir no fragmento que se segue:

"Ahora bien, la convicción que nos hemos formado a propósito de esto es que en la obra de Marx hay una "teoría del derrumbe" pero que allí, por otra parte, también hay razones para refutar, en principio, la validez de cualquier teoría de esta especie. Dejamos de lado la cuestión de la periodicidad de las crisis y de su progresivo agravamiento que, en la obra de Marx, es una cuestión quizás elaborada de manera menos concluyente. Según nuestro parecer, una cabal y auténtica "teoría del derrumbe" es, por lo menos, "la ley de la caída tendencial de la tasa de ganancia". Aquí la palabra "tendencial" no debe inducir a engaño. En efecto, esa palabra está indicando por cierto que "la ley en cuanto tal" es frenada por la acción de causas antagónicas que "contrarrestan y neutralizan los efectos de esta ley general, dándole simplemente el carácter de una tendencia". Pero ello no quiere decir que la ley quede anulada o suprimida, sino que su "vigencia absoluta se ve contenida, entorpecida"; vale decir que la ley tiene vigencia, pero en un arco más largo de tiempo y a través de un proceso más complicado. En efecto, si asi no fuese, ni siquiera se comprendería por qué hay que hablar de ley" (grifo nosso)

A perspectiva colocada por Coletti merece ser valorizada à luz das sequelas depressivas das últimas três décadas. Depois do esgotamento dos assim chamados, "trinta anos de ouro", o capitalismo mundial entrou em uma fase de ciclos cada vez mais curtos, mas com taxas de crescimento que são próximas da metade do período do pós-guerra. Com a redução da importancia das políticas keynesianas anti-cíclicas, o papel preventivo da ação do Estado se reduziu, embora não tenha sido eliminado.

Característicamente, as recessões destes ciclos mais curtos foram também mais brandas, quase como se o movimento de rotação do Capital fosse preventivamente acelerado, mas controlado para evitar depressões demasiado profundas. Ou seja, a substituição de equipamentos obsoletos por máquinas mais eficientes obedece a uma necessidade de redução de custos que está na raiz do just in time, do toyotismo, da qualidade total e de todas as inovações gerenciais dos últimos dez anos.

Mas o coração do sistema precisa bater cada vez mais rápido, porque o volume de sangue é cada vez maior, em um corpo que permanece do mesmo tamanho. A pressão sanguínea tem que subir. O remédio dos vasodilatadores, a intervenção premeditada do Federal Reserve, do Banco Central Europeu e do FMI, tem os seus limites. Sobre esse tema é interessante a argumentação de Paul Singer:

"Marx tem o mérito de ser o pensador econômico que colocou a crise no centro de análise da produção capitalista. Em O Capital Marx mostra as condições das possibilidades de crise no capitalismo. Mas, nesta análise econômica não se encaixa a previsão de que as crises deverão se tornar sempre mais extensas e destrutivas. É possível que a teoria que Marx desenvolveu sobre a tendência declinante da taxa de lucro sustente tal conclusão, mas esta teoria carece de consistência lógica, pois algumas das contratendências, apontadas pelo próprio Marx, podem perfeitamente impedir que a taxa de lucro decaia no longo prazo".(grifo nosso)

Se há contra-tendências, como o próprio Marx foi o primeiro em admitir, a tendência à queda da taxa média de lucro pode ser, de fato, neutralizada. A questão é, todavia, mais complexa que um exercício de escolástica marxista. O problema histórico não é saber se é possível que a tendência possa ser neutralizada. Mas, responder por quanto tempo e em que condições. Parece incontornável que o crescimento do pós-guerra nos países centrais reuniu condições tão extraordinárias que, dificilmente, seriam reproduzíveis.

Um capitalismo que teria superado a tendência a crises cada vez mais severas? Não estamos entre os que procuram tranqüilidade de espírito transformando uma teoria em construção em um texto canonizado. Não há como contornar a necessária tarefa de confrontar as hipóteses com a realidade concreta. Mas é o próprio estudo da evolução das variáveis econômicas do capitalismo, nas últimas três décadas, sistematicamente publicados pelo Banco Mundial, que indica a queda das taxas médias de lucro.

Recordemos os fundamentos da teoria: Marx apostava na hipótese de que o peso crescente do maquinismo, ou seja, da ciência objetivada como tecnologia, exigiria uma tal imobilização de capital, que a tendência à queda da taxa média de lucro seria irrefreável, donde o prognóstico da precipitação de crises mais destrutivas e devastadoras. Como se pode conferir de uma das passagens mais extraordinárias dos Grundisse:

"En la misma proporción, pues, en que en el proceso de producción el capital en cuanto capital ocupe un espacio mayor con relación al trabajo inmediato, cuanto máz crezca pues el plusvalor relativo – la fuerza creadora del valor, propria del capital – tanto más caera la tasa de ganancia" (...) "Es esta, en todo respecto, la ley más importante de la moderna economía política y la esencial para comprender las relaciones más dificultosas. Es, desde el punto de vista histórico, la ley más importante. Es una ley que, pese a su simplicidad, hasta ahora nunca há sido comprendida"(grifo nosso) ,

Na mesma linha vai a apreciação de Gramsci, que não se inclina pela fórmula de igualar tendência e contratendência, uma anulando a outra, ad infinitum e, tal como pareceria ser a opinião de Marx, insiste na idéia da primazia da lei:

"Quando a tendencidade se converte em uma característica organicamente relevante, como neste caso, no qual a queda da taxa de lucro é apresentada como aspecto contraditório de outra lei, a da produção de mais valia relativa, na qual uma tende a suprimir a outra, com a previsão de que a taxa de lucro será predominante".(grifo nosso)

Os últimos cento e cinqüenta anos, no entanto, já foram um intervalo histórico suficiente, para se concluir que o capitalismo não morre de morte natural: suas crises convulsivas, por mais terríveis, não resultam em processos revolucionários, a não ser quando surgem sujeitos sociais com disposição revolucionária. Compreender a primazia da lei, na longa duração, ou seja, a vigência da tendência mais profunda à crise, não significa aceitar o prognóstico de crise final.

Explicação monocausal e pluricausal das crises econômicas de superprodução

Admitindo-se que as crises são inevitáveis, quais seriam os seus fatores de impulso? Muito sumariamente, um primeiro divisor de águas se estabeleceu no marxismo entre os que se inclinam por uma explicação monocausal, e outros pelas pluricausais. Sobre o conceito de crise em O Capital e a hipótese pluricausal, a partir de um critério lógico/histórico, ou seja, o processo de construção da teoria, vale conferir em Jorge Grespan:

"A apresentação dialética das categorias, portanto, que segue o percurso do seu objeto justamente devido ao caráter contraditório dele, expõe a cada passo deste percurso também o aspecto negativo do capital, ou seja, a tendência à crise que lhe é inerente. Não admira, então, que não haja um capítulo específico de O Capital dedicado às crises, pois em cada momento a contradição constitutiva do capital se manifesta em um conteúdo diferente de crise: interrupção do fluxo de compras e vendas ou de pagamentos; incompatibilidade entre produção e consumo; desproporcionalidade entre os setores em que se divide o capital social; queda da taxa média de lucro; sobre-acumulação e desvalorização do capital existente. Para reconstituir o conceito de ‘crise’, é preciso considerar a relação entre ela e o capital ao longo do conjunto da apresentação das categorias e conforme todos os momentos específicos de sua totalidade." (grifo nosso).

Admitamos que o argumento é forte. Talvez haja algo mais a considerar sobre a inexistência de um capítulo específico sobre as crises n’O Capital. As crises, na teoria marxista, são elementos cruciais para formular o problema da superação revolucionária do capitalismo. O socialismo não é só um imperativo moral, mas uma necessidade histórica. A revolução será necessária porque o capitalismo condenará a humanidade a terríveis convulsões destrutivas. Podemos talvez presumir que esse capítulo só pudesse aparecer no final da obra, no âmbito do tratamento da totalidade mais ampla, que é o pressuposto para pensar a problemática da transição. Marx não chegou até lá, como sabemos. É a tese de Mészaros em "Para Além do Capital", e parece sugestiva.

Entre os que consideram que a crise teria uma determinação fundamental, uma contradição ou antagonismo como força motriz, ou seja, uma causa central, se debate qual seria esta: se a baixa tendencial da taxa de lucro, ou se outras, como a tendência do capitalismo a desenvolver o progresso técnico sem restrições quaisquer que elas sejam, aumentando a capacidade produtiva instalada de inundar o mercado, enquanto impõe limites estritos ao consumo popular, do que resulta a superprodução de valores de troca e o subconsumo de valores de uso. Marx compreende o subconsumo popular como uma das causas, mas não como uma das forças motrizes da crise, conforme se poderá concluir:

"É uma mera tautologia dizer que as crises surgem da falta de consumo solvente ou de consumidores capazes de pagar. O sistema capitalista não conhece nenhuma classe de consumo que não seja solvente, excetuando-se os pobres e os mendigos. O fato de que as mercadorias não possam ser vendidas quer dizer simplesmente que não se encontram compradores ou, o que tanto vale, consumidores solventes para elas (tanto faz se as mercadorias se destinam em última instância ao consumo produtivo ou se destinam-se ao consumo individual). E se pretende-se dar a esta tautologia um aparência de raciocínio profundo, dizendo que a classe operária recebe uma parte demasiado pequena de seu próprio produto, e que este mal pode remediar-se concedendo-lhe uma parte maior, ou seja, fazendo com que aumentem seus salários, cabe observar que as crises vão precedidas sempre, precisamente, por um período de subida geral dos salários, no qual a classe operária recebe uma maior participação na parte do produto anual destinado ao consumo. A rigor, segundo os cavalheiros do santo e "simples" sentido comum , esses períodos parece que deveriam, pelo contrário, afastar a crise. Isto quer dizer, portanto, que a produção capitalista implica condições independentes da boa ou má vontade dos homens, que só deixam uma margem momentânea para aquela prosperidade relativa da classe operária, que é sempre, além disso, um pássaro que pressagia a crise." (grifo nosso).

Para os fins que nos interessam, no momento, é suficiente assinalar o que não seria especialmente polêmico, ou seja, que no marco do ciclo industrial, o ciclo de renovação do capital fixo, as flutuações da taxas de crescimento ou recessão estão estreitamente associadas às flutuações da taxa de lucro. Em outras palavras, a crise teria na sua raiz a incapacidade de produção de uma massa de mais-valia que garanta a valorização do capital. Produzir o quê, aonde, para vender para quem? A crise é, por estas razões o momento da máxima vulnerabilidade do Capital.

Deste processo resulta uma queda no nível de atividade: aumento do desemprego, deflação, falências das empresas que atuam abaixo do nível de produtividade média, fusões e concentração de capital. A fase descendente do ciclo se aprofunda verticalmente, mas com intensidade variável dependendo das circunstâncias político-sociais concretas, até que a queda no nível de emprego tenha pressionado, de tal forma, no sentido da queda do salário médio, e a desvalorização e destruição de capitais tenha atingido um tal nível, que a massa de mais-valia se recomponha, junto com a diminuição da massa de capital, garantindo a recuperação da taxa de lucro.

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